sexta-feira, 9 de agosto de 2013

9 de agosto de 1997: Morre Betinho, a voz maior da cidadania

Por: Lucyanne Mano

"Quando se tem o que eu tenho, você começa a descobrir que a vida é todo dia, que o bom é estar vivo hoje. E é assim que eu vivo".
Betinho


O sociólogo Betinho, 60 anos, morreu em sua casa no início da madrugada, em decorrência de uma série de distúrbios relacionados à deficiência de funcionamento do fígado e dos rins, após uma aguerrida luta contra a Aids. Hemofílico como seus dois irmãos, o cartunista Henfil e o músico Chico Mário, Betinho viveu ameaçado pela morte desde que nasceu, e também como eles, tornou-se portador do vírus após uma transfusão de sangue. Maior defensor da vida no Brasil, foi idealizador e líder da Ação da Cidadania contra a Fome, a Miséria e pela Vida, e dirigiu a maior campanha nacional em defesa dos pobres e famintos.


Era casado com Maria Nakano, com  quem teve o filho Henrique. Teve outro filho, Daniel, do primeiro casamento.

Nascido Herbert José de Sousa no dia 3 de novembro de 1936, em Bocaiúva, interior mineiro, Betinho começou a fazer políticos aos 18 anos, influenciado pelos padres dominicanos da Ação Católica. Em 1962, fez parte do grupo de jovens católicos a fundar a Ação Popular, a AP, que militava por um socialismo humanista. Durante o governo de João Goulart, trabalhou como assessor do ministro da Educação, Paulo de Tarso, dedicando-se especialmente ao ambicioso Programa Nacional de Alfabetização, o PNA, inspirados nas idéias do educador Paulo Freire e que se propunha acabar com o analfabetismo no país num espaço curto de tempo.

Com o golpe militar de 1964, foi obrigado a passar para a clandestinidade e depois a deixar o país: A AP foi uma das organizações mais visadas e perseguidas pelos militares. Ao longo de seus anos de exílio, continuou na militância, colaborando na formação de grupos de estudos e de formulação teórica sobre as questões e os impasses brasileiros. Voltou ao Brasil em 79, como o “irmão de Henfil”, da música O bêbado e o equilibrista.

Em fevereiro de 1993, quando o presidente Itamar Franco anunciou o Programa de Combate à Fome, foi convidado para coordenar o Conselho Nacional de Segurança Alimentar. Alegando sua frágil condição física, recusou o convite, mas aceitou participar como consultor do projeto. Betinho se tornaria a grande mola propulsora de uma mobilização popular contra a fome sem precedentes na história no Brasil. Em poucos meses, a Ação de Cidadania contra a Fome, a Miséria e pela Vida alcançaria marcas inéditas. De junho de 1993 até junho do ano seguinte, 25 milhões de pessoas contribuiriam de alguma forma – com doação de dinheiro, de alimentos e roupas – e outras 2,8 milhões se engajariam diretamente na campanha, atuando em um dos 4 mil comitês do projeto criados em todo o país.

O impacto real do trabalho feito nos quatro anos de campanha, entretanto, manteve-se imensurável. Além da doação material, motivada pelo lemaQuem tem fome, tem pressa, a corrente de solidariedade promoveu o regate da cidadania e a inclusão social, demonstrando a capacidade de mobilização do povo brasileiro.

A trajetória de vida de Betinho é a história de alguém que superou com dignidade seu terrível drama pessoal e se engajou na luta de um Brasil melhor. Deixou uma coleção de livros importantes para se compreender melhor o país, centenas de artigos e uma das mais atuantes organizações não-governamentais do país, o Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas, o Ibase. Mas o obstinado trabalho em favor dos 32 milhões de brasileiros totalmente desamparados, é certamente o seu grande legado.

"A morte acaba com tudo, mas a memória traz de volta a vida. As pessoas só existem na memória". Betinho


Fonte: Blog Hoje na História CPDOC/Jornal do Brasil. Disponível em:  http://www.jblog.com.br/hojenahistoria.php?itemid=4085

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